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terça-feira, 6 de novembro de 2007

Salto Alto

Meu desequilíbrio é fascinante! Certamente, qualquer psicólogo, analista, estudioso da alma, adepto da observação e pessoa afim teria multiplas sessões de êxtase observando toda minha loucura, todo o meu cinismo, minha timidez e, até, meu libido.

Uauaua! Prendam-me depressa! Preciso ser LOUCO!

Ops, agora não! Arrumo a gola, pego os papeis e caminho, meio sem vontade. E...

Atravessou a sala e caminhou em direção a ele, sem muito ânimo, mas com a convicção de que aquela situação era necessária. Nos pequenos metros que os separavam, só teve tempo de pensar dez metros, mas para que mais, se dez metros eram sufucientes para seu pensamento rápido e inquieto? Pensou que não queria estar ali, mas se estava, tinha que mandar ao inferno todos os ideais pregados pela Santa Amada Igreja, e só uma vez, dessa vez, ser (no mínimo) cínica. Ao pensar nisso, lembrou de sua amada mãe, Amada com A Maiúsculo, porque é muito respeito, apesar dela a ter abandonado ainda criança na casa da tia. Ah, que infância... Melhor não lembrar!

Lembrei de mim, de tudo que me ensinaram, de tudo que acho que sou... mas, se não faço o que acho que sou, talvez eu não seja. Como ser, ou o que ser então? Meu Deus, está chegando, não sei o que dizer, o que vou fazer...

Tarde! Estava parada em sua frente, ele com o olhar de sempre, apesar de no fundo dele mostrar algo de errado. Na verdade, não era só o olhar que parecia diferente, mas também os gestos, as palavras, tudo! Não era o olhar de sempre... Olhava para o chão quando conversavam, e seus poros pareciam entregá-lo: algo definitivamente estava errado. Teve, então, a idéia de ser cínica.

Ser ou não ser, Deus meu, ser ou não...

Tarde de novo! Viu-se perguntando se estava tudo bem e ele respondendo que sim. Perguntou então, como que encarnado um espírito ruim: E a vida de merda, continua na merda ou já superou essa existência deprimeite?. Ele olhou, sem entender, e perguntou: Enlouqueceu? Não, respondeu numa gargalhada, Não, não e não! Quem está louco é você! Ou não! Precisa ser louco meu caro, só os loucos são felizes, só os loucos, repetiu enquanto se via jogada na mesa, com o dedo no meio da cara dele, que suava frio e estava tão vermelho quanto seu olho com conjuntivite. Ela gargalhou e trancou a porta. Fitando-o com paciência, ela disse: e aí, é agora ou prefere mais tarde? Ele levantou-se da mesa e, sem dizer nada, procurou entender. Ela disse: não entenda, apenas sinta. Você está disposto a entender? Ele respondeu que não, balançando a cabeça, como se sua língua estivesse amarrada ou pesada. Tudo bem, disse ela, você não merece o que tenho pra te oferecer. Mas já estou na lama, quero comer você... Você não entende nada, você finge fazer as coisas certas, mas não está disposto a amar, que é a coisa mais sublime que qualquer um de nós pode fazer. Amar é o que nos resta, você entende isso? Mas você não sabe amar! Come sua esposa toda noite, acha que ama sua mãe, mas quantas vezes procurou sentir o que os outros sentiam? Você é tão irracional como essa mesa, você é um coitado! Você, você... Ah! gritava, com todo ódio que pudera sentir dentro de si. Sabia que aquilo não tiha volta, mas griyou a ponto de perder a voz e chamar a atenção de todos. Gritou até lhe faltar o ar, e continuou: você não merece nem ser chamado de porco, você é um nojo... Nojo! Gritava, enquanto começava a quebrar a sala, com toda sua força apesar da falta de ar. Escorria de seu rosto, agora pálido, não mais suor, mas uma lágrima, no canto direito de seu rosto frio... Frio.

Arrombaram a porta, pegaram-a e chamaram a polícia. As velhas queriam saber, os jovens riam, os outros tentavam reanimá-lo, mas ele já não tinha mais ânimo. Ele sabia que quase tudo era besteira, mas não amar... não amar... eu não sei amar?!

Ela foi internada, e enquanto a carregavam numa camisa de força amarelada pelo tempo, pensou naqueles que já a utilizaram, naqueles que agora a julgavam louca, naqueles que não sabiam que ela existia. Sorriu calmamente, levantou o olhar, pediu para que não a apertassem, parou e gritou, enquanto tentava ajeitar o cabelo suado: sou tão livre quanto qualquer um de vocês. Sou a consciência daquele infeliz, sou tão lúcida quanto esse idiota que me carrega prum hospício. Mas escrevam o que digo: eu volto! Ah, se volto! E volto tão triunfante quanto agora, com meu salto alto e tudo. Salto alto... Tome Amélia, referiu-se à secretária que sempre quisera pensar, apesar de nunca saber como. Tome meu Scarpin de dez euros, meu amor, sabe contar? São quase trinta reais de luxo e elegância. São coisas que não se compram, mas dá pra enrolar. Pegue meu amor, não tenha medo! Loucura não passa, acredite, repetia, enquanto tentava se equilibar e jogar um dos sapatos pra longe. Ela deu um último jeito no cabelo, sem o auxílio das mãos, olhou pro alto e viu cair algo. Era ele, pronto, agora livre do vigésimo andar...

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