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quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Reflexo

Em frente ao espelho, todos os dias pela manhã, vejo meu reflexo e não me reconheço... é meu aquele reflexo? Onde está, onde está o meu reflexo?

Desespero-me! Lavo o rosto apressadamente, derrubo os sabões e depois me olho... mas agora, agora não me agrada o que vejo: um rosto medroso, que não sabe o que quer, se quer o que é, quanto mais o que há.

Respiro.

Acalmo-me, depois de jogar ao longe todos os cremes e loções que melhoram os rostos mas empobrecem a alma...

Respiro...

Agora, enquanto algo escorre pelo piso frio do banheiro, a porta pulsa num ritmo desesperado... devem ser aqueles pobres fingindo preocupação comigo quando queriam que eu já estivesse estendido, no chão, ao cheiro de hidratante com mijo.

Não respondo. Respiro...

Meu Deus, preciso me achar antes que descubram minha loucura... Mas não tenho coragem de olhar no espelho... tenho medo do que ele reflete... um instante... o que essa merda reflete se não a realidade como é?! Mas o espelho inverte o que há... o espelho mente no que mostra... o espelho...

Olho-me no espelho, bem no olho que há ali refletido, e derrepente encontro um alento, um caminho, um acento, um trilho: há um pingo de ternura em meio àquele turbilhão de desespero. Essa ternura me congela e responde aquilo que preciso ouvir.

Sorrio aliviado...

Já não há mais problema, minha procura acabou. Maldito espelho! Reflete o rosto mas não revela a essência... bom dia, alma minha...

Andarilho

_Sabe o que sou, menininha? Pergunta ele, em seu cavalo magro, um pouco cansado, depois de atravessar aquele lugar. Cheio de poeira e incrivelmente abatido, ele estava, inexplicavelmente, feliz.

_Espero que tragas boas novas, sorriu a menina, cordialmente.

Eles caminham juntos, a rua deserta e triste. Ele põe a delicada menina no lombo do cavalo, aperta sua mãozinha delicada e diz:

_Que bom seria se a cada passo que eu desse, voltasse o tempo e repisasse da maneira correta. Mas a vida, inexplicavelmente viva, não me dá esse luxo. Não nos dá esse luxo. Você me entende?
, aponta para a menina, que só balança a cabeça e ri. A vida não nos dá esse luxo, minha querida. No máximo, a vida nos dá bons amigos para recolher os nossos erros e nos alertar do que fizemos.

Ela sorri e os dois seguem em frente, agora mais felizes.

Relatos de um desesperado.

Ensanguentado no chão, já não sentindo as mãos, a vista quase vazia... ele olha a luz que brota das brechas da porta... mas agora já não há hora, mas também não há pressa. É saborear o momento derradeiro antes da liberdade verdadeira... ao fundo, um som grita em brisa "ser livre, ser o que sonhou..."

_ Minha solidão nunca foi problema, diz. O problema é a afeição. Respira... Por quê não me cortam os punhos, pra que eu seque e não desenvolva mais amor? Destruam meu cérebro! Sim, destruam meu cérebro, grita, com os olhos cheios de água... destruam meu cérebro, porque aí não raciocino e vivo apenas de vegetar... vegetação, vegetação... ri. Mas não, não me matam ou me libertam... ao contrário: alguém me dá, todos os dias, as chances de viver. Amanheço vivo, inteiro, renascido e cheio de esperança. Por que? E aí, aí, ri novamente, aí me jogam as migalhas... me conquistam e depois me falham, como se eu fosse um papel barato, que não vale nada, que no primeiro instante é descartado, talvez reciclado... reciclado?! Agora não. Não, respira e ri, confuso. É isso: me reciclam todos os dias, me conquistam e depois brincam. E eu padeço... mas mereço? Não, eu não mereço, eu não mereço! Grita e tenta levantar caindo de mau jeito sobre sua mão direita. Agora, ele sente muita dor, mas é derradeiro, pensa. Eu não mereço... mas esqueçam, seus urubus de asas tortas... esqueçam, porque eu não esqueço! E, se querem saber, no primeiro erro, tudo será vingado. Tudo estará vingado... é isso: vingado... me aguardem...

Fecha os olhos... mas não dorme. Espera. Ao fundo, uma melodia diz: fazer tudo que eu não fuis, lutar por meu lugar no mundo e conseguir...

Libertar...
acompanha ele, ao som que vem do quarto...
Libertar...

Is Secret

"É segredo!", é isso que dizem seus olhos negros, pequenos e serenos... É isso que dizem eles quando encontram os meus, antes de você desviá-los pra bem longe da verdade, ou para bem longe de mim...

Que bom seria se os segredos fossem expostos somente aos envolvidos; mas malditos são esses segredos, que nasceram para serem apenas segredos, só seus segredos, não meus também...

Se eu soubesse um milímetro desse segredo, o suficiente para ter certeza que o segredo sou eu, juro, juro que mandaria ao inferno todos os segredos, todos os sentimentos, e todos os constrangimentos... danem-se todos!

Agora só nosso segredo importa... mas é segredo. É segredo...

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Testamento

Pego o bilhete amassado. Leio com pressa aquelas linhas tortas, um pouco tremidas, mas muito amigas... "São suas, sei que são", penso.

"Caro amigo...

Sei que não tenho sido um bom companheiro, se quer tenho te tratado direito... desculpe-me, inclusive, essas linhas tortas. Imagino sua cara de idiota lendo essas minhas besteiras... como sempre, recorro à escrita para sanar aquilo que deveria fazer com a palavra. Ou melhor, com a fala. Adoro o olho no olho, você sabe, mas estou estagnado, realmente muito cansado... enfim, estou cansado... não sei se aguento olhar em seus olhos de novo. Também não quero olhar em seus olhos de novo. Chega de sofrer com ações desnecessárias. Posso paracer um fraco, e sei que sou, mas sinceramente, prefiro... prefiro dar um fim a isso tudo. Chega de tentar manter uma coisa sem sentido, essa relação mesmo tão sem sentido. Desculpe-me a franqueza, mas reconheça sua culpa: você é tão fraco quanto eu, você é tão imoral quanto, tão pobre quanto... você nem ao menos fala, meu Deus, você não fala... sei que sou pedante, irritante, cansativo e frustrante... sou até mais que o que queiras dizer, mas meu Pai, só queria que reconhecesses tua culpa nisso tudo. Enfim, quero que te fodas, na moral não chore nem... nem ouça? Rima né, mas não fique triste, a metáfora do "garfanhoto" é verídica, sou isso aí mesmo, faço mal e depois parto pra outra, como agora, como sempre... como sempre...

Espero que me perdoe, que sejas feliz, que reconheças todas as culpas e que, honestamente, não erres novamente. Acreditas que, um dia, todas as verdades te serão reveladas? Insisto nessa parada porque é ela que me agrada...

Acabou o tempo... Cuide-se.

Te amo, mas não dá mais. Embora... adeus..."

Mensageiro.

São cinco e trinta da tarde, estou parado num ponto de ônibus desconfortável e mal localizado, perto do nada e longe de tudo. Olho ao meu redor e vejo rostos conhecidos, amigáveis... descartáveis. Nada deles me excitam, a não ser suas presenças agradáveis nos momentos destraídos. Agora vem um ônibus, e já nem lembro se estou aqui há muito tempo. Viver em lugar qualquer deteriorou meus nervos, já nem sei bem o que é o tempo. Na minha cabeça repetem-se versos delicados de um cantor que descobri agora a pouco...

Eu finjo ter paciência...
Eu finjo ter paciência...
Eu finjo ter paciência...

Os versos fundem-se com uma frase que há muito tempo me faz castigo, apesar de ainda estar vivo. O ônibus agora balança "irritantemente", penso, e me deou conta que irritante e excitante são quase a mesma coisa... Ora, será que gosto, então, e não me dou conta? Estou confuso e meu coração continua a palpitar de desgosto. Quanto mais eu tento, mais eu erro, e me agrada o erro, mas não esse erro, porque agradam aqueles que cometo, não os que os outros me fazem cometer.

_Como?, pergunta uma senhora gorda e negra que está ao meu lado. Seu rosto é velho, de quem trabalha ao sol, suas marcas de expressão são firmes, bem delineadas, dentes brancos e perfeitos.

Olho pro lado e procuro não pensar em nada, mas agora, vejo as faces tristes e cansadas de um lugar qualquer que parece estar sempre triste, sempre cansado... sinto-me mal em estar ao lado de pessoas tão cansadas, exaustas de existir, envelhecendo mais e mais a cada segundo. Sinto meu ombro e...

_Como?, repete, um pouco espantada. Pronto! Estou pensando alto, de novo.

_Nada, senhora, digo baixo, escondendo lágrimas? Estou chorando? O que há comigo?

_Você está chorando, meu filho... quer um calmante? Eles não falham! Você está indo pra casa? Se não nem adianta... olhe, eu nem tomo quando vou pro trabalho, só quando vou pra casa, porque é chegar e desmaiar, entende? Desmaiar... Ela ri, inocentemente, e continua a falar as coisas, enquanto volto para meus rostos tristonhos à espera de fluxo. No vidro dos carros vejo o meu rosto cansado, e me dou conta que envelheço mais que antes. Me desespero. Ah, o desespero... não compreendo como desenvolvo fácil tamanhas mazelas, mas o que me resta se não as loucuras benditas de minha mente doentia? Levanto-me depressa, quase derrubo a velha, que me recrimina por deixá-la falar só. Puxo rapidamente a cordinha, aperto o maldito botão... "pára, droga!", repito, enquanto agora todos me olham.

Balanço derradeiro...
Freio bem quisto!

Desço numa calçada esburacada. Agora devem ser seis horas... estou distante de meu destino numa rua perigosa, mas o que me importam as horas se não tem sentido. Olho as pessoas a pé, olho as pessoas nos carros, as balconistas das lojas e suas maquiagens de quinta categoria. Subo e desço buracos em calçadas, desvio e piso firme em vazios... caminho sem rumo, certo de que agora estou mais próximo de minha essência: sem rumo, sem futuro... nem dá para respirar fundo porque, meu Deus, que ruas de bosta.

Caminho mais um pouco, e mais um pouco, e mais um pouco. Agora chega a pior hora: chego em frente à escola. Subo devagar seus degraus até atingir a porta. Entro, me dirijo até outra porta e me deparo com uma fila. Enorme. (Faltam palavras!). Será contagioso o cansaço?

Pra quê viver uma vida sem sentido?
Pra quê viver uma vida sem sentido?
Pra quê viver uma vida sem sentido?

Subo de escada, pra quê elevador? Talvez pra não sentir mais dor. Nem sei direito o que é a dor. Refiro-me à dor física ou à dor da alma? Calma, pára e anda, depois fala! Alguém me olha esquisito, então sorrio e corro, subo, subo, subo... Chego ao terceiro andar, e agora aqueles rostos. Ai, os rostos. Volto à escada, dou uns tapas na minha cara... "agora, lindo, aquele sorriso sem sentido, vai", repito, enquanto me sinto mais vivo. Ando mais um pouco, agora pra frente. Entro silenciosamente e me sento. Pronto, lá vem o meu degredo.

Aproxima-se
Aproxima-se
Aproxima-se

Baixo a cabeça. Respiro...

Palavras

Tenho muito o que dizer
Tenho o mundo pra te dizer
Mas como fazer?
Posso descrever?

Tenho coisas pra dizer que as palavras não poderiam descrever; são sensíveis demais pra serem ditas, quem sabe com o tato você sintiria...

Tenho dores, amores, flores e cores que queria muito te descrever; quero, inclusive, que descrevam você, que preencham você, que sejam você...

Tenho, não nego. E pelo contrário: grito alto: tenho mundos e fundos para te oferecer, só não sei direito o que fazer, tenho querer, arder, tremer e... e você?!

Tenho... tenho um monte de coisas, tenho... agora é tão confuso, falta uma conclusão que não sei chegar porque não há mais tempo: acabou a inspiração.

Expire...

Silêncio solitário secretamente alucinante...

Amo-te tão silenciosamente que respiro pausadamente pra não denunciar meu fado...
Amo-te tão solitariamente que caminho fácil por entre a multidão, estagnado...
Amo-te tão secretamente que olho sempre pros lados, nervoso e atento, cansado...
Amo-te tão alucinadamente que procuro remediar meus passos, pra não entregar o fato...

O fato.
O fato...
Que fato?

Amo-te alucinadamente, mas tão silenciosamente, que cada segundo dessa loucura é acúmulo de prazer e agonia, ânsia e alegria... sozinho e companhia... é secreto, mas todos sabem; é solitário, mas todos... todos... todos estão? Todos são?

Amo-te, e isso me basta, como respiro, bato e vivo... logo, existo.
Amo.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Bem alto!

Minha loucura é toda candura, desde criança me esbaldo na loucura. Tadinha de minha conduta... coitada dessa pobre criatura... lembro-me como daqui a pouco, quando caminhava pelo pátio engraçado e observava o mundo, tão esquisito, quando derrepente... ah, não, foi diferente? Confusa...

...

Mas, agora tanto faz... já está tudo no chão mesmo, já está tudo no chão. Ah, não, salvem-me, lá vem aquela louca novamente, agulha em punho, anjo de sangue... sai daqui, sua louca maldita, anjo branco escurraçado dos céus! Sai, não me toque...

O que importa?

Caminha calmamente pelo pátio. Deve ter quantos anos? Sete, oito? E seus pais, onde estão? Seus sonhos já não estão... Ela caminha vaga, pelas meninas, pensativa quando apenas deveria ser menina. Pobre menina...

_Pobre menina, repetiu Patrícia, rodeada de suas amigas bonitas. Mas não há nada mais constrangedor que o frio que se recebe de alguém.

_Ei, agora berrando, eu falei com você, sua anormalzinha!
_ Ha ha ha ha ha ha ha... riam, as outras menininhas, enquanto ela continuava, vazia.
_Ei, agora com força, enquanto jogava o conteúdo da lancheira em sua cara.
_Por quê você fez isso? Perguntou, novamente viva.
_Porque me faz bem maltratar você.

Ela agora estava viva, e como era estar viva? Há tempos não sabia o que era melhos. Se quer, se já foi melhor, se vai ser melhor. Seria cedo para pensar nisso, mas não pra ela, não pra ela. Tomada por uma ânsia que, mais tarde, aprenderiam bem, limpou o rosto, aproximou-se e encarou a menina narina com narina:

_Vou maltratar você só uma vez. E prometo que você não vai querer me ver outra vez, disse, olhando firme em seus olhos.
_Vou acabar com você, gritou, descontrolada e já agarrada aos cabelos da outra. Antes que pudesse lhe causar mais alguma dor, a menina simplesmente encostou a boca em seu ouvido, abriu bem a mandibula, fechou com força e sentiu, pela primeira vez, o gosto de sangue. Na boca. Um prazer imensurável tomou conta dela, que agora via todas as menininhas pérplexas, enquanto ela, apenas cospia um pedaço de carne cru, enquanto limpava o vestido.

A menininha gemia, escornada no chão, com um grito assustador de dor. Sua dor agora era toda a dor, para todos uma grande dor, mas pra ela só uma boa dor. Acordou para a vida, acordou para o mundo, viu-se rindo daquilo, e depois esqueceu do que se passou... a sala da diretora, a cela escura e fria, as sessões de choque e tantas fugas.

Pobre menina: tão menina, mas sem amor... tão criança, e, ao mesmo tempo, tendo que ser tão adulta. Não merecia...

Terapia

Nada é o que parece, repito, aflito, antes de sair da cama, no começo de mais um louco dia.

Agora, minhas costas doem, meu rosto está disfigurado, mal acordei e já estou cansado.

Nada é o que parece,
Nada é o que parece,
Nada é o que parece, repito baixinho, antes que vejam minha sessão matinal de repito... estou com sono. Mas a vida me chama, já não tenho mais ânimo para cama.

Nada é o que parece, repito, antes que me vejam tão sombrio. Repito, até que abro a porta e, agora, me vejo cego, o sol, a luz, muito claro! Claro!

_O que há, me perguntam.
_Não sei, estou em órbita, respondo.
_Você e essa sua conversa de bosta, escuto, enquanto me colocam café. Estou sonhando? Café e bosta? Como assim? Não entendo... pego a xícara, café ou bosta, e, sem querem, já estou levantando quando lembro que há um segundo joguei a xícara e seu conteúdo na cara do nojento. Café ou bosta? Bosta queima? Não, então já sei: não era bosta.

Enquanto um grita e outros levantam, me tranco no banheiro. Preciso lavar o rosto.

Abris os olhos!

Abris os olhos enquanto é tempo!
Porque o tempo não tem senso,
O tempo é como o vento:
misterioso e passageiro.

O tempo pode destruir a vida,
Mas o tempo também semeia, linda!
O tempo é parceiro,
Mas é instável, e por isso traiçoeiro!

Abris os olhos agora...
Já, quase, não há hora!
E o que vai ser depois?
O que vai ser de nós dois?

Abris os olhos porque o tempo é passageiro,
Por que a vida é bailarina:
Dança, mas uma hora cai.
E se essa hora chegar, oq ue vai ter sido de nós dois?

Abris os olhos enquanto ainda te tenho,
Porque no dia que expulsar você...

Fome

Seus pés são meu melhor brinquedo.
Sereno, me esbaldo com seu enredo,
Enquanto você me olha,
Gulosa, com aqueles olhos de medo.

Deslizo em seus dedinhos,
Mastigo-os, todos tão macios.
Tão felinos, e até caídos... e famintos.
Sacio meu delírio, mas até quando? Logo, novo vício!

Seus pés.
Amo-os porque te trazem pra mim.

Seus vazos.
Adoro-os porque só provam que não esperas: segue em frente, aprende, serpente ardente!

Teus pés descalços são belos traços, são tudo o que eu preciso, são meu feitiço, meu caminho, meu ardente abrigo nesse mundinho. Venha com seus pezinhos, mas venha de fininho. Pezinhos...

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Brigamos

Os lençóis sujos jogados pelo chão gelado do quarto escuro...
Os vasos, aos cacos, espalhados aos montes pelos pés das paredes...
As flores, aos pedaços, hora pregadas nos móveis, hora despedaçadas por onde quer que olhassemos...

Tudo denunciava nossa fúria, e não era para menos. A porta estava prestes a explodir de tanto que palpitar, e dela vinha o mundo, perguntando se estava tudo bem, se havia algum problema, o que era que estava acontecendo... não importa o que há no mundo lá fora, se o maior problema está aqui dentro. Não importa...

Eu, na janela; ela, na beira da cama, imunda, aos prantos. Nós, nus em pêlo de roupa, e mais pelados ainda em alma: machucados, cansados, perturbados, acabados apesar de vivos. O ar é extremamente denso, e chego a ouvir sua respiração pesada de ódio, respiração como a de alguém que mata por fetiche, para passar tempo, para relaxar... bebo outro gole de whisky, agora tudo está fundido. Tudo está... e eu estou tonto. Não temos mais palavras, estamos exaustos, esbaforidos, acabados, abalados. Traição não se faz.

_Isso não se faz, repeti...

Recomeço. Agora, ela enxuga as lágrimas, se esconde atrás de outro lençol, como se agora sim tivesse vergonha. Penso em chamá-la de suja, mas como? Mais sujo talvez seja eu... quero chorar, mas não por ela, nem na frente dela, não para ela. Ela? Como teve coragem? Como teve?

Agora é ela quem me olha. Não sei se estou bêbado, mas ela se transfora, levanta-se lindamente, pega a garrafa e, num gole, bebe o que restava de bebida. Agora, os dois estamos... como estamos? Não sei, mas logo não estaremos mais em nós. Ela me encara e derrama:

_Achas que tudo que temos é porque merecemos?
_Eu não sei, estou confuso, mas eu não mereço o que você me fez.
_Eu fiz o que quis, você não diz que temos que fazer nossa vontade?, pergunta.
_Mas traição não, respondo.
_Meu amor, ela me olha nos olhos, sei mais de você do que você pode imaginar. Você não me engana, viu? - sorri-, Sei tudo de você, e mesmo com seus óculos escuros, de mim não há nada que você possa esconder. Nada. Você entende?
_Você quer dizer que...
_Você não quis me dizer, mas e daí? Eu não ligo. Sei que me amas porque sinto, simplesmente. Mas, e você? Me ama? Se me ama, então por quê não perdoa?

O mundo agora gira muito, vejo minha mão cortada, talvez pela cerâmica do vaso, talvez por outro caco. Abraço, agora me vejo chorando em seu colo... o mund girando, tudo fundido, seu cheiro quente e úmido, seu carinho em meu cabelo assanhado. Talvez durma, mas me acalmo. Calmo... calmo... calmo. Até quando?

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Nálfrago

Você acredita que, um dia, todas as verdades nos serão reveladas? Só quero acreditar que, um dia, todas as minhas verdades serão postas, expostas e amostras.

Porque nesse dia, nessa bendita nova era de existência real e divina, de felicidade estridente e coração contente, ah! Nesse dia eu terei você. Com todas as forças do mundo, sob todas as formas e rumos: terei você, de verdade você, e mais nada.

Tudo agora é perfeito, de maneira mais humilde quanto simples como há de ser, sentirei a ti e você a mim e aí eu serei você e você vai ser "mim". Pra mim, em brim...

Coloca cuidadosamente o conteúdo dentro da garrafa. Empurra a rolha, leva à boca: beija e despeja. Longe, aquelas palavras agora flutuam, leves como a pluma no ar. São as doces palavras no mar. Ele mergulha, imerge e emerge, solitário, como há anos, naquela maldita ilha tropical avulsa. Já faz tanto tempo, que suas lágrimas e aquela água agora são uma só. E ele, só.

Fim de semana

Novamente olhando o céu retangular pela janela suja de meu quarto escuro, agora penso, mudo, na besteira do mundo. E de tudo...

_A solidão é minha companheira - pauso.
_Minha única certeza - continuo.
_A mais sutil das gentilezas: amarga, mas seca. - concluo.

Estou novamente só, deitado num chão empoeirado, um pouco gelado e muito gasto de minhas lamúrias... choro mais uma valsa, derramo mais um passo, pego aquela caneta de deixo jorrar um sangue quente que há pouco corria na minha veia esquerda... ele corre em direção ao lençol, já me sinto mais leve, já me sinto mais limpo, já me sinto vazio.

Flutuo... e, finalmente, sinto.

Tic, tac, tic, tac, tic, tac...

Agora, um calor estranho toma conta de minha barriga, uma ânsia parece estacionada em minha garganta doída, como se essa ânsa estivesse pronta para explodir e inundar minha vida de agonia.

Mastigo algo mais...
Folheio outra revista...
Aperto o teclado do celular...

Mas não passa. Não passa... não passa! E não há como passar mesmo... sei bem que isso é ansiedade, e que ela só passa quando estou contigo. Se bem que sua indiferença me mata, me arrasa, me pára...

Vejo-me perdido num misto de sensações ruins e deprimentes, sensações humilhantes que são o alimento de minha alma há pelo menos já nem sei quanto tempo... quanto tempo? Um ano, dois meses, cinco minutos, quem sabe? Alguém sabe medir o tempo da alma? Eternidade tem segundo? Quem sabe? Ninguém sabe. Nem eu sei direito...

Mas queria muito que você soubesse, e que você me tirasse desse martírio, porque as almas, elas não existem para sofrerem sós... no máximo juntas. As almas nasceram para encontrar alento umas nas outras, no caso meu e seu, a sua na minha e a minha na sua. Só sua. E quando invado a janela de sua alma, naqueles instantes finitos mas para mim tão gostosos e vagarosos; quando invado o esconderijo de sua alma medrosa sinto e até vejo sua inquietação, sua satisfação com tão pouco, vejo todo o misto de sensações... Vejo seu apelo por mim e até seu desejo, repouso, sob algum perdido...

_Depresa, levante-se! Acabou seu tempo, acabou o tempo, acabou, acabou, o tempo, não há...

Buuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuum!

_Não há mais tempo...

Fuga

Na confusão das sensações, estava perdido e muito cansado. Cada músculo de meu corpo doia inacreditavelmente, até as batidas desse pobre coração eram mais pausadas, demoradas e sofridas. No meio disso tudo, tudo o que eu queria era ser você. Mas esse mundo chato e sem futuro não me proporciona nada se não manter vazio esse coração sofrido e fraquinho, que se apega fácil, se apaixona muito rápido, acaricia com muito tato e exímio...

Mas, aí, aí tudo parou, aí tudo mudou e eu vi você! E, que louco quando fugimos por um segundo... todos à nossa espera, todos à nossa procura e nós, soltos, perdidos num mundo vazio e fútil mas encontrados em nós, mergulhados num profundo abismo castanho escuro. Como são lindos seus olhos escuros: meu mundo. Tudo...

Apelo!

Se eu pudesse condensar numa gota, como a de água, tudo que quero que saibas, que aprendas, que sejas, que te valhas; juro, eu tentava...

Tudo eu faria para que você aprendesse rápido, fácil e indolor...

Mas só a vida ensina, foi assim que aprendi o que sei: foi por ela que sou quem eu sou, e só a prisão de minha alma pode me trasformar em algo pior do que sou.

Por que você me trata mal, se te amo tanto e só quero teu amor?
Por que me tratas assim, se só quero o que há de melhor pra ti?
Não me amas como eu te amo?
Saibas que amo, apesar dos anos!

Se eu pudesse, juro que tudo faria para que fosses como nos sonhos, mas esse dom eu não possuo, não quero, jamais vou poder comprar...

Ah, se Deus me permitisse comprar! Juro: terias de tudo, inclusive verdades e muita alegria. Tudo seria do teu jeito, não havieria dor, pelo menos você não sentiria dor... os outros, talvez, mas por você até eu sinto dor, por que os outros também não, não é?

Se eu pudesse, se eu pudesse, ah, se eu pudesse... mas agora não há tempo. Corra, vai! Quem sabe você alcança! Essa é a sua hora, nada mais por ti posso fazer, até porque de mim sei que não queres mais saber. Mas vá, a vida ensina, tudo ao nosso redor ensina. Viva...

Sentimento verdadeiro

Respeito o seu sentido
Apesar de não ver sentido no seu sentido
Tudo bem que haja prazer no seu sentido
Mas há mais sentido possível.

Você já parou para sentir hoje?
Há uma realidade
uma verdade
até fatos e possibilidades possíveis que só dependem de você abrir as portas para o mundo.

Há sentido no que digo?
Talvez não, mas veja o que eu digo;
ouça o que te falo:

Há vida para além dessas paredes tortas...
Por favor, abra-nos vossas portas...

Autoimóvel.

Sinto falta de tocar, mas nesse lugar - de pessoas frias não tanto espiritualmente, mas sim pelas circunstâncias termo-climáticas e afins dessa província de ar úmido, mormaço abafado e fedido -, nesse lugar de criaturas frias de suor gelado e pegajoso, nesse lugar o tato não é mais que o contato acidental no coletivo cheio e desconfortável. O contato não vai além do braço distante dos "contatos".

_ Ai, Jesus! O que ei de fazer: quero comer você mas por quê?

_ O quê?!

Novo ciclo

Nasço
Cresço
Aprendo
Limo
Morro
Renasço...

Enfático, num segundo, pro mundo!

...

Nasço em cada manhã que acordo vivo.
E morro todas as noites, enquanto morro de sono.
Dentro do sono, eu sonho
E limo a experiência, amadureço e cresço.
E...

Nasço
Cresço
Aprendo
Limo
Morro
Renasço... até quando?

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Homenagem

------------- Perdoe esses versos tortos, a rima pobre e as idéias soltas. Tudo, um dia, se acerta. Tudo. Você acredita que um dia todas as verdades serão reveladas? Prepare-se, e pare! -------------

Nariz empinado
Boca torta
Cabelo ao vento
Talento, oh, que talento!

.......melindrosa
.......maravilhosa!
.......deliciosa
.......rosa
.......cheirosa!

Pôr-do-sol em tupi
Você precisa parar de agir
Você precisa se vestir
Você precisa sumir!

Mas não suma em tupi

Suma pelo caminho das pedras, enverede-se pelos caminhos de encanto, que te tornam melhor e muito mais humano. Encare a vida, e os planos, com o canto, aquele canto, tanto encanto quanto tanto! Viva feliz e pense assim: pense...
.pense..
..pense.
...pense
E observe, serve, verte. Ele, inerte.

Não é defeito esconder o que se pensa, mas é proteção se resguardar do que não presta. Pense, pense, pense, pense; olhe, veja, cale, e observe! Esconder o que pensas é mais que proteção: é cuidado, é carinho consigo mesmo. Não perder tempo com qualquer um, e buscar no caminho o equilíbrio, o sentido, o ritmo, o signo e, por que não, o cinismo.

Eu também não sei direito, e não pense que é fácil ser assim, ou mesmo chegar até aqui. Mas você chega, você supera, você agarra, você ama; esqueceu, você é humana?!

Acredite no ser humano, todo ser humano, todo o ser humano! Tem um ser humano que te adora, tem vários seres humanos que te mostram. Não humanos? Bem, cavalos dão coices, vacas dão bosta!

Escute e pense.
Não diga.
Guarde-se, resguarde-se, preserve-se e Aguarde.

Ponto

Cumpro minhas horas assiduamente. A minha existência não é à toa, muito menos a minha sede, e a minha fome, e a minha inquietação e a minha relação. Escute bem o que te digo: nada, neste ser, é em vão!

As minhas horas são sagradas, ainda que as suas horas sejam "desorganizadas".

E não me interessa se seus sonhos já foram destruídos, e se você já perdeu o tesão pela vida, e se não há qualquer valia. Em quê me interessa saber o que te cansa, meu Deus, isso me cansa!

Morte aos seus sonhos mortos, à sua existência sem vida, à sua essência sem filosofia, ao seu sentido que não tem sentido! Cada uma das gotas de suor que derramo pensando em meus sonhos e meus valores e meus amores, enquanto espero darem as horas que faltam para completar as horas, cada uma delas valem a pena pelo fato de me tornarem um homem melhor, por tornarem minha existência de maior sentido, mesmo que ainda não tenha achado todo o sentido, por me fazerem sentir: essa é a coisa certa a fazer.

Vivo minhas horas pra não perder as horas. As outras horas. E vivo essas benditas horas para satisfazer aquilo que outrora me incomoda. Sou um eterno caçador, de sentido. Por favor, não perca suas horas! Ainda não sei o que fazer direito com as minhas horas, mas se você também não sabe o que fazer das suas horas, por favor, preserve as minhas horas. E chegou a hora, é hora de ir embora. Não chora...

Antropofísica às avessas

Ainda bem que não posso te comer.

Se conseguisse comer você
(por inteiro, pedaço por pedaço)
Se pudesse te trazer pra dentro de mim
(ainda que pra dentro de pobre estômago)
Se fosse possível transformar você em nós
(eu mais você, você e eu igual a nós)
Se Deus permitisse fazer de mim casa de você
(Deus existe? Talvez por isso, ele existe. Será?!)
Se só me restasse comer você...

Ah!

Aí você iria ver tudo que quero te oferecer!
Aí você iria ver minha constante ebulição!
...........................minha constante inquietação,
...........................meu desejo
...........................minha semente
...........................minha essência
...........................minha gentileza...

Ah, se você pudesse ver.
Ah, se eu pudesse comer você.

Fonte...

Encontro-me com sua boca, e toda minha existência melhora, toda a minha vida se renova, toda minha experiência torna-se sublime. Demore o tempo que for, só a possibilidade de estarmos vivos já nos enche de alegria e vontade de viver mais, pra encontrar um ao outro, pra renovar um ao outro, para exercitarmos o tato um com o outro: beijo sua mão, sinto seu cabelo, toco suas costas, mordo a sua língua...

Entre seus lábios doces, estão a minha existência, e meus sentidos, e meu vigor, e meu viver, meu existir! Vivo pela esperança de, mais uma vez, tocar seus lábios, beijar sua boca, ligar-me a você da maneira mais humilde, mais simples, mais ingênua, derradeira. As coisas tornam-se simples, e nada mais é complicado, porque sua doçura, essa ternura atenua meu viver...

Entre seus lábios finos, nada é vazio, e nada é pequeno, e nada é demais, e nada é de menos... Tudo é perfeito, tudo torna-se perfeito, tudo torna-se eterno, tudo tem sentido, tudo tem carinho e, até, seu cantinho. Toda a existência age para tornar eterno esse momento. E o tempo congela, enquanto suamos graças ao calor exaustante desse lugar nenhum...

Entre esses lábios formosos, grossos, sedosos e melosos, a vida tem sentido. Sim, agora há algum sentido. Acho que há, até, todo sentido! A vida faz sentido, e tudo tem sentido, mesmo que, ao sair, talvez nem tudo tenha sentido. Tu tens sentido? Tudo tem, sentido. Talvez tenha te tido, sem tido seu sentido...

Em que importam as dúvidas e incertezas? Por maiores que sejam as dores, por mais exaustante que seja o meu ou o seu cansaço, por mais triste que seja a vida, a existência, o toque do telefone que nunca atende, o turo turo tatuado no meu peito... seja como for, e seja o que for: em seus lábios tudo se renova, tudo melhora, tudo revigora... tudo!

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Tábua Rasa

Passam as horas, cheias de minutos, e segundos, e centésimos e milésimos... E passa a minha vida, e hoje ninguém me liga, e agora ninguém me espia. Maldito seja esse celular, inútil objeto de

Mas, porquê a fadiga? Essa é a sua vida!

As pessoas sobrevivem num vazio de almas, enquanto minha alma só busca procurar sentido. Olho pro relógio, procuro o celular, mastigo mais um pedaço e, ainda assim, não me desfaço do vazio. Do vazio, do vazio, do vazio de meus passos, do vazio de meus sonhos...

Pra quê viver uma vida sem sentido?

Se é pra viver sem sentido, ao menos me ensine em quê sentido! Não entendo, não compreendo, não me contento. Minha sede não cessa, apesar de ainda não encontrar... Cadê o sentido? Cadê seu vestido? Onde está? Onde estar? Aonde estar? Você vai chegar? É isso? Mas, é tão vazio! Estou só! Estou só? Não me deixe só! Eu tenho medo: do mundo, do muro, do turvo... de tudo.

Céu de retângulo.

De meu quarto de cinco metros de largura por três de comprimento, apenas minha janela sobria parece ter movimento. Estou trancado há cinco minutos e ainda não faleci, apenas empaleço, respiro apusadamente, desço... mereço?

Há tanto calor, em tão pouca vida, que, deitado de bruços, chego a sentir cada gota de suor que surge na pele cansada de minhas costas. Sinto cócegas, às vezes cólera, às vezes náuseas... Que bosta, coitada de minhas costas!

Há solidão, há pouca vida, pouca fé, pouca vontade. Tudo se vai, e enquanto olho um retângulo de céu pela grade de minha janela, sinto a vida, sinto a morte, te sinto, me sinto e até rimo. Meus pensamentos voam, minha solidão me incomoda, mas já estou cansado, não sei se quero ir embora. Não sei o que posso fazer, não sei, se quer, se há algo mais a fazer. O que me resta? Falta sentido, talvez ser dito, bendito e bem quisto. Mas como? Em meio a objetos inanimados, eu sou só mais um a fazer volume, enquanto não sirvo às engrenagens desse lugar qualquer. Não quero nem lembrar...

_Eu estou cansado, repetiu enquanto segurava as lágrimas de raiva, meu Deus, vocês me falam de compreensão, mas quanto vocês me compreenderam? Vocês já pararam pra me compreender hoje? Pra mim chega! Não insisto mais, porque isso tudo me desgasta demais! Não quero mais insistir em relações furadas. Chega! Chega! Chega! - gritava, enquanto as lágrimas salgdas de desgosto corriam por sua pele porosa.

_Mas você é que é muito complicado, retrucou com a maquiagem borrada de suor.

_É verdade!, disse a outra, meio anestesiada pelo efeito do álcool, você não relaxa, quer sempre que a gente seja como o povo de lá... assim não dá, não dá... e gasgalhou, achando graça de sua piada rimada: lá, assim não dá, perfeito, tô melhorando a cada dia...

Enxugou as lágrimas, vestiu o casaco e saiu, sem far satisfações. Todos ao seu redor apenas observaram, elá se foi, entre tantos desconhecidos, pela noite escura e incrivelmente morna. Pegou o ônibus, desceu uma hora depois, exausto, tirou a roupa e se jogou na cama, a janela aberta e o quarto incrivelmente quente, apesar das duas da madrugada.

Quero viver, e por quê? sussurou...

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Aprendi

Suo e limo
Suo e limo
Suo e limo
Suo e limo

Limo vidas vazias
Limo Alegrias
Tristezas de qualquer espécie também,
E mazelas e calvários também.

Limo amores
dores
cantores e atores

Limo tudo que puder ser feito
Limo até o imperfeito!

Limo a vida, mas como me cansa esse fardo. Limar a vida não é fácil!
Limo e suo porque é dífícil. O suor, inclusive, é o esforço de meu ofício.

O que me resta, se só sei que Limo? Nasci pro Limo, cresci com o Limo, e hoje Limo, mas não como antes. Meu Limo hoje é rico, fruto trazido pela experiência divina. Peço a Deus pelo meu Limo, e observo a vida com os olhos que sinto. Vejo com o tato, o olfato e até com o taco. Vejo com tudo que preciso, e vejo tudo que pressinto. Observo, às vezes falo. E suo. E Limo.

É o que sei fazer: suo, mas Limo.

Olhos

Mergulho em seus olhos negros, sem medo do que pode me acontecer. Que me resta se não me perder na imensidão de seus segredos?
De mim podes esconder tudo, mas quando mergulho em teus olhos esquisitos, todas as verdades se revelam. É inexplicável quanto são infinitos...

Mergulho fundo...
...fundo...
...fundo...
...e mais fundo...

Quanto mais mergulho em seus olhos claros, mais fico frágil, mais tenho medo, mais tenho desejo! São seus olhos negros que me guardam. Minha alma repousa em ti, e a isso nada dá jeito!
Quanto mais me perco nos seus olhos secos mais te conheço, e mais te surpreendo: entro em você sem você perceber; roubo suas defesas sem você querer...

E não me venha com seus clichês de rimas pobres ou rimas ricas... que importam as rimas se suas tripas estão apreensivas? Sabes da verdade que te digo, sabes de tudo que sinto. Sabes também o que sentes?

Mergulho em seus olhos vermelhos. Não sei se são negros, não sei se são claros; fecho o olho de medo quando olho seus olhos! Mas sinto seus olhos e tudo que há dentro de seus olhos. Desejo seus olhos, mergulho fundo em seus olhos, mergulho profundo em sua vida, pra ver se atinjo aquela ferida.

Engarrafamento

O fluxo da grande metrópole foi interrompido, está interrompido, permanece interrompido. Tudo está parado. Tudo.

Enquanto caminho por entre calçadas sujas e esburacadas, enquanto vivo vazio e sem muita vida, enquanto respiro ares poluídos de esgoto e gases afins, enquanto tento viver, ou melhor, sobreviver, caminho rumo a um futuro sombrio e observo, observo a vida a meu redor, ou aquilo que deveria ser vida. Observo as pessoas, essas pessoas tão estranhas que mais parecem objetos, seus brinquedinhos, seus hábitos. observo...

As pessoas, em seus carros, estão todas mortas! Seus olhares já não dizem muita coisa, não há vontade de viver. A vida apenas permanece ali porque se há uma tarefa para fazer. Todos temos que fazer, mas a vida não melhora, não dá prazer, não evolui. Em plenas horas da manhã, as pessoas estão, trancadas em seus carros, com olhos sem brilho, corpos cansados e alma sem vontade, exaustos por uma noite de sono certamente mal durmida. Ou será que não foi a noite, mas o dia? E se foi a vida, e não o sono? São todos pedaços da engrenagem da grande cidade...

Eu, como eles, não sei o que faço, nem mesmo para onde vou. Mas, daqui de fora, é mais doloroso observar o pouco de vida que há em nossas vidas, o pouco de tudo que há em tudo (ou seria o nada que ocupa quase tudo?), é mais difícil observar a engrenagem e suas facetas...

O fluxo está interrompido. A vida já está parada há muito tempo... caminhamos pra onde? Vamos chegar a onde? E, se chegarmos, encontraremos quem?
O fluxo está interrompido? Tudo bem, já não há pressa, já não há mais ânimo, já não há mais vida... entendeu que fluxo está interrompido?
O fluxo está interrompido...

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Amor...

Estava mal. Seu corpo tinha toda a força possível, e todo desejo possível, e todo amor possível, e todo tesão possível, e tudo mais que fosse possível. Estava de volta, depois de tanto tempo... estava, de novo, em casa. Os velhos amigos, as velhas coisas, a poeira boa, o sol escaldante e delicioso, o ar seco, as mulheres... tudo evoluíra, apesar de parecer tão igual à última vez... o vento brincava com seu rosto, dava vida a sua existência vazia e sem vida que se desenrolava pelas ruas da metrópole, quando estava longe. Mas agora não, agora ele estava em seu lugar no mundo, com as pessoas de seu mundo, os objetos de seu mundo e tudo que era seu por direito. Tinha tudo para estar feliz, mas a alma estava machucada, por isso estava mal. Machucada pelo que agora lhe acontece na metrópole, e cansada também pelo que acontecia em seu próprio ninho, a alma interferia diretamente no corpo. As dores da metrópole eram mínimas, seriam nada se não fossem as coisas de sua casa. Como dói ver tudo que via, sentir tudo o que agora sintia. Mas, para isso, apenas tempo e paciência. Nada mais lhe restava se não viver exacerbadamente cada segundo, se embebedar de vida aqui, pra quando chegar ali, se arastar em busca de sentidos. Restava viver, viver pra viver. Tentou...

Saí com meus amigos. Saí com a vida, caminhei sem rumo, senti cada movimento dos ventos, da poeira, cada relevo do paralelepípedo, das paredes pintadas com cal, saí com vontade de viver e derrepente, vi você... Que surpresa boa, que visão maravilhosa, que vontade irresistível. Meia hora depois, lá estavamos nós, nus, um tão o outro, um tão do outro: totalmente dedicados, entregues, desarmados, talvez apaixonados... mas minha alma é sua, minha existência pertence a você, e de você não há nada que possa esconder. Senti seus beijos, seu carinho, sua sede, seu calor, senti você... mas para as almas, não dá para mentir, almas não se enganam. Almas não...

_ Algum problema?
_ Não, respondeu, distraído, enquanto tocava sua mão.
_ Não minta pra mim, conheço bem você e sei que há algo de erado. Está muito cansado?
_ Também. Nesse momento, sentiu uma vontade inexplicável de chorar, e quando percebeu, estava em prantos, como um bebê indefeso que precisa de carinho. Ela olhou, incrédula ao que via, e, sem reação, abraçou-o contra seu peito e acarinhou seu cabelo.
_ Não chore, ou chore, faça o que você achar melhor. Eu estou aqui, nós etamos juntos, é isso que basta, disse um tanto trêmula.

Ela era a melhor de todas as mulheres fáceis com as quais ele já havia deitado em sua vida. Sempre foi de poucos, somente se entregava àqueles que gostava, e se gostava, se dedicava obsessivamente. Chegava a ser irritante. Mas não com ele, porque ali havia um encontro de almas, e duas almas, quando se encontram, se entendem simplesmente. Entre eles, a relações de alma era diferente: naturalmente se entendiam e se ransformavam em determinadas situações, como aquela. Ele não chora, Homem não chora, mas ali ele chora para uma mulher, mulher da vida, prostituta, vadia... Ela não ouve, só dá, "tudo o que você quiser d mim. Sou seu objeto de estudo, faça de mim bom proveito, sou sua..." costumava dizer, nos momentos de êxtase. Ela se transformava quando ele precisava, ele se transformava quando era preciso. Ela se transformou. Ele sabia que ela se transformaria, por isso, talvez, confiance tanto nela. Chorou, e la se transformou...

_ Queria poder te ajudar, mas não posso te dar mais que o que te ofereço agora. Posso fazer algo por você?
_ Dor na alma ninguém resolve, resolve? Perguntou, em soluços.
_ A alma a gente esquece, ou quem sabe deixa ela fugir. Você não quer deixá-la livre, talvez seja disso, e só disso, que ela precise.
_ Não sei como...
_ Relaxe, rosnou, enquanto brincava com sua boca. Beijou sua nuca, e desceu, lambendo todo seu corpo, enquanto ele procurava sentir cada toque, cada movimento da língua, cada aroma que surgia daquele momento. Ele a puxou pelo cabelo, deu-lhe um beijo como nunca tinha dado e rasgou sua pouca roupa num único movimento. Ela nada fez, a não ser se deixar levar. Deixou-se levar, foi o que ele queria que fosse, amou, puro e simplesmente...

Depois do amor, observava seus contornos, enquanto ela dormia, como um anjo. Um anjo nu em sua cama de espuma. Agora, tudo era abafado, mas o abafado nunca o foi tão agradável. Simplesmente procurou viver aquilo para acumular mais um momento bom para quando não mais estivesse lá. Procurou dormir... e durmiu... mas não sonhou.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Encontros

"Eu fiquei contando as horas pra falar com você...
Eu não via o momento de te encontar...
Eu andei rodando o mundo, sem jamais te esquecer...
Quando o amor acha o rumo, sempre vai durar!
Recomeçar... depois de um tempo tão longe... Quero ter você perto de mim! E transformar dois destinos num mesmo, ocupar no mundo um só lugar..."
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No meio de todo aquele movimento, tudo o que eu queria era encontar um terminal no qual pudesse fazer tudo que tanto precisava fazer: trabalhar. Segui pelos corredores, entrei nas várias salas, em meio à loucura da vida da metrópole, em certos momentos me pego não como um ser humano que pensa e sente, mas como um objeto, mais um na engrenagem louca desse lugar sombrio. Me pego com dores no corpo e na cabeça, me pego não pensando, me pego insensível a todos os meus sentidos, e o pior, adoeço, cada vez mais, eu, meu corpo e minha alma.

Penso nisso tudo em menos de um segundo, e vejo o quanto ainda estou vivo. Procuro mais um pouco no meio de tantos rostos que não conheço, sempre com olhares mortos, todos cansados e infelizes. Que tristeza, que beleza: eu no meio de um monte de zumbis... Que beleza. Procuro mais um pouco, mais um pouco, mais um pouco, mais um...

Vi você!

"Não vejo mais você faz tanto tempo...
Que vontade que eu sinto...
De olhar em seus olhos, ganhar seus abraços, é verdade, eu não minto!
E nesse desespero em que me vejo...
Já cheguei a tal ponto...
De me trocar diversas vezes por você, só pra ver se te encontro..."

Gelei! Por um segundo, eu gelei. Vi você, mas não vi só você, vi sua alma, desarmada, nua, desamparada. E vi seu desejo, nossa verdade, enfim a certeza de que nada era engano, nada era em vão: eu desejava você, você deseja cada curva de meu corpo, cada gota de suor, cada pêlo, cada aroma, cada coisa... Talvez, eu também deseje, mas ainda não sou aquele mestre que você afirmou um dia eu ser. Não, baby, ainda não sei ler as almas em um segundo. Se quer sei decifar as almas, pelo menos não todas as almas, só algumas almas, aquelas almas, alma. Só as ditraídas, só as saudosistas, só as carentes, só... só a sua, baby! Entendo sua alma, porque já comi sua alma, devorei sua presença, me embebedei de suas lembranças. Pena que nunca te amei... se tivesse amado, seria dono absoluto de sua alma, você não teria saída, baby, você seria mais um pertence meu, mais um brinquedinho vivo: o melhor de todos os brinquedos. Talvez você fosse eu. Mas você fugiu, baby, você fugiu.

Não parei de procurar. Você desviou o olhar como quem via o que não queria ver, eu continuei meu calvário em busca de um lugar no mundo. Nesse mundo. Mas, e no seu mundo? E no nosso mundo?

"Baby
Baby
Baby, Ah...
Há quanto tempo?
Baby
Baby
Baby
Ah..
I Love You... Você... Precisa saber da piscina, da margarida, da carolina, da gasolina...
I Love You, I love you..."

Salto Alto

Meu desequilíbrio é fascinante! Certamente, qualquer psicólogo, analista, estudioso da alma, adepto da observação e pessoa afim teria multiplas sessões de êxtase observando toda minha loucura, todo o meu cinismo, minha timidez e, até, meu libido.

Uauaua! Prendam-me depressa! Preciso ser LOUCO!

Ops, agora não! Arrumo a gola, pego os papeis e caminho, meio sem vontade. E...

Atravessou a sala e caminhou em direção a ele, sem muito ânimo, mas com a convicção de que aquela situação era necessária. Nos pequenos metros que os separavam, só teve tempo de pensar dez metros, mas para que mais, se dez metros eram sufucientes para seu pensamento rápido e inquieto? Pensou que não queria estar ali, mas se estava, tinha que mandar ao inferno todos os ideais pregados pela Santa Amada Igreja, e só uma vez, dessa vez, ser (no mínimo) cínica. Ao pensar nisso, lembrou de sua amada mãe, Amada com A Maiúsculo, porque é muito respeito, apesar dela a ter abandonado ainda criança na casa da tia. Ah, que infância... Melhor não lembrar!

Lembrei de mim, de tudo que me ensinaram, de tudo que acho que sou... mas, se não faço o que acho que sou, talvez eu não seja. Como ser, ou o que ser então? Meu Deus, está chegando, não sei o que dizer, o que vou fazer...

Tarde! Estava parada em sua frente, ele com o olhar de sempre, apesar de no fundo dele mostrar algo de errado. Na verdade, não era só o olhar que parecia diferente, mas também os gestos, as palavras, tudo! Não era o olhar de sempre... Olhava para o chão quando conversavam, e seus poros pareciam entregá-lo: algo definitivamente estava errado. Teve, então, a idéia de ser cínica.

Ser ou não ser, Deus meu, ser ou não...

Tarde de novo! Viu-se perguntando se estava tudo bem e ele respondendo que sim. Perguntou então, como que encarnado um espírito ruim: E a vida de merda, continua na merda ou já superou essa existência deprimeite?. Ele olhou, sem entender, e perguntou: Enlouqueceu? Não, respondeu numa gargalhada, Não, não e não! Quem está louco é você! Ou não! Precisa ser louco meu caro, só os loucos são felizes, só os loucos, repetiu enquanto se via jogada na mesa, com o dedo no meio da cara dele, que suava frio e estava tão vermelho quanto seu olho com conjuntivite. Ela gargalhou e trancou a porta. Fitando-o com paciência, ela disse: e aí, é agora ou prefere mais tarde? Ele levantou-se da mesa e, sem dizer nada, procurou entender. Ela disse: não entenda, apenas sinta. Você está disposto a entender? Ele respondeu que não, balançando a cabeça, como se sua língua estivesse amarrada ou pesada. Tudo bem, disse ela, você não merece o que tenho pra te oferecer. Mas já estou na lama, quero comer você... Você não entende nada, você finge fazer as coisas certas, mas não está disposto a amar, que é a coisa mais sublime que qualquer um de nós pode fazer. Amar é o que nos resta, você entende isso? Mas você não sabe amar! Come sua esposa toda noite, acha que ama sua mãe, mas quantas vezes procurou sentir o que os outros sentiam? Você é tão irracional como essa mesa, você é um coitado! Você, você... Ah! gritava, com todo ódio que pudera sentir dentro de si. Sabia que aquilo não tiha volta, mas griyou a ponto de perder a voz e chamar a atenção de todos. Gritou até lhe faltar o ar, e continuou: você não merece nem ser chamado de porco, você é um nojo... Nojo! Gritava, enquanto começava a quebrar a sala, com toda sua força apesar da falta de ar. Escorria de seu rosto, agora pálido, não mais suor, mas uma lágrima, no canto direito de seu rosto frio... Frio.

Arrombaram a porta, pegaram-a e chamaram a polícia. As velhas queriam saber, os jovens riam, os outros tentavam reanimá-lo, mas ele já não tinha mais ânimo. Ele sabia que quase tudo era besteira, mas não amar... não amar... eu não sei amar?!

Ela foi internada, e enquanto a carregavam numa camisa de força amarelada pelo tempo, pensou naqueles que já a utilizaram, naqueles que agora a julgavam louca, naqueles que não sabiam que ela existia. Sorriu calmamente, levantou o olhar, pediu para que não a apertassem, parou e gritou, enquanto tentava ajeitar o cabelo suado: sou tão livre quanto qualquer um de vocês. Sou a consciência daquele infeliz, sou tão lúcida quanto esse idiota que me carrega prum hospício. Mas escrevam o que digo: eu volto! Ah, se volto! E volto tão triunfante quanto agora, com meu salto alto e tudo. Salto alto... Tome Amélia, referiu-se à secretária que sempre quisera pensar, apesar de nunca saber como. Tome meu Scarpin de dez euros, meu amor, sabe contar? São quase trinta reais de luxo e elegância. São coisas que não se compram, mas dá pra enrolar. Pegue meu amor, não tenha medo! Loucura não passa, acredite, repetia, enquanto tentava se equilibar e jogar um dos sapatos pra longe. Ela deu um último jeito no cabelo, sem o auxílio das mãos, olhou pro alto e viu cair algo. Era ele, pronto, agora livre do vigésimo andar...

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Fervo...

_Não faça isso! Gritei, apavorado, em meio àquele alvoroço.
_Vou fazer, respondia com um olhar de prazer que mata qualquer um só pelo mal que carrega.
_Não faça, implorava inutilmente...
_Vou fazer, vou fazer, vou fazer!
_Não faça, repeti.
_Faço sim, faço sim, faço sim, já fiz!
_Não, por favor, isso não, não... não!


Tarde demais.

Derrepente, senti minha garganta seca. Os minutos, que poderiam ser os mais simples de toda minha vida, tornaram-se os mais difíceis e custosos de toda minha existência. Como eu te odeio, era tudo que conseguia raciocinar, enquanto observava seu olhar de peixe podre, que não tinha a mínima consciência do ato, insano, que tinha feito. Que cabeça de Merda, pensei, Merda com M Maiúsculo, pra denegrir mesmo, pensei... Não foi fácil...

O simples fato e inspirar e depois expirar tornou-se insuportável, inviável, doloroso, inútil... O ar rasgava minhas vias, e minhas veias pareciam não suportar o oxigênio a elas atravessava. Doia cada gesto, existir já era motivo de dor. Dolorosa existência, oh meu Deus, e no meio daquilo tudo, eu só queria sumir, ser livre, voar, viver. Sentia tudo, apesar de não saber, ao certo, o que eram aquelas sensações novas. Talvez estivesse morto e não sabia.
Calor!
Senti queimar o meu rosto. Posso mentir pro mundo, mas minha timidez me entrega, sempre às mãos frias ou ao rosto vermelho. Era tanto calor, que talvez o suor da mão tivesse evaporado. Era muito calor, Ainda murmurei baixinho "não faça isso...", mas era tarde. Sentia meu sanhgue borbulhar de tanto ódio, tinha uma febre emocional dentro de mim e, passados alguns segundos, ainda não tinha morrido, mas também não tinha passado, porque as horas, ah as horas, essas malditas coisas que agora não sei nem explicar parecem passar iguais, mas na verdade não passam, não pra mim! Vá você passar pelo que passei e verás que meus segundos de vergonha te matariam. As horas, ah, as horas. Senti uma lágrima correr o lado esquerdo de meu rosto quente, misturando-se ao suor e a tudo mais naquele ambiente inquientante e constrangedor. Meu Deus, pensei, o que se havia de fazer? No máximo, me restava uma vingança doce e suculenta, já que aquela pobre alma desprovida de qualquer astúcia não era párea para minha grandeza... Era isso: esmagá-la como uma barata nojenta e... e depois? Ei, mas vingança não é uma boa. E conformismo também não! Que ódio, ódio...

"...tempo,tempo, tempo, tempo, tempo..." gritava uma porção de mim, aquela burra e idiota, que sempre se ferra até o fim, mas que no fim... xeque-mate! Eu sempre me ferro do começo ao meio, mas no fim, ah, o fim é semrpe triunfante e vitorioso pra mim. Olho pra trás e vejo como venço, como melhoro, como sou melhor a cada segundo. É isso: tempo, e fim; no fim, o tempo dá todas as respostas. Eu recebi todas as respoastas, porque essa pobre alma também nao iria receber?

Pensei alto, chamei a atenção de todos, e retornei para aquele momento horroroso! E descobri... e a vergonha já não era tão forte, a respiração estava boa, o momento já não era tão horroroso! Continuei a balbuciar timidamente as palavras, vi seus rostos de satisfação, levantei-me da cadeira e saí. Fechei a porta, respirei fundo e saí de meu calvário; e ao saír me deparei com aquilo... monte de carne podre inútil que faria um favor à existência se deixasse de existir. Respirei novamente, dei um tapa em seu ombro e saí, sem palavras, enquanto sentia seu ar de derrota e covardia. "Pô, devia estar pensando, ainda não foi dessa vez... não foi...". E fui.

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Cuide-se Tereza, um novo mundo espera por nós dois e quem mais vier... Tudo!

domingo, 4 de novembro de 2007

Velocidade

No dia a dia de minha vida vazia
eu pego ônibus todos os dias.
Enquanto balanço, vejo a vida da janela suja e embaraçada
Vejo os carros, as pessoas e a calçada. Ah, as calçadas!

No dia a dia de minha existência triste
eu perco muito tempo.
Enquanto avançamos eu e o mundo
as horas escorrem sem dó,

Estamos condenados a perder tempo,
Estamos condenados a envelhecer sem aproveitar o tempo...
Não sentimos o tempo, só consumimos o tempo, descartando a vida como a embalagem que já não serve pra nada.

tempo tempo tempo tempo tempo...

Enquanto parto e chego a lugar nenhum, as calçadas passam todas tão iguais, apesar de tão diferentes... As calçadas passam diferentes quando sinto o freio do motor, e entre uma parada e outra, eu sobrevivo, enquanto sigo em frente, sem saber pra onde...

casamento sem amor

Outubro de 1992.

Foguete era a única coisa à qual Ele poderia se apegar agora. Ele era filho único, sozinho no mundo apesar de tudo, tudo. Apertava foguete contra o peito como quem precisa muito de algo pra si... aquele misto de sensações novas e esquisitas o deixou confuso, e Ele não sabia que só queria chorar. Ele não sabia...

Na porta do quarto, de pijama azul piscina, Ele via, sem entender, aquela discussão dolorosa; sentia algo ruim dentro de si, e como saber o que era se, coitado, sua vida só se iniciara a tão pouco tempo. "Ainda tô aprendendo", repetia. Com os olhos cheios d'água e com o coração apertado, Ele assitia os dois gritarem e se baterem, tão diferente do que eram lá fora, tão diferente do ensinaram a Ele. Derrepente Ele viu ela cair em lágrimas, enquanto ele olhava pela janela, com dó, mas ainda forte. A dor que ela sentia Ele sentia em dobro, e no fundo ele também, e eles queriam ajudá-la, mas como? Ele mal sabia o que era aquilo. Já ele queria, como ninguém, aquelas lágrimas.

Ele permaneceu na porta do quarto, agora recolhido no chão, como ela, e derrepente sentiu escorrer de ser rostinho de sete anos uma gota quente de dor. Ele esquivou as sobrancelhas, tetou segurar o choro, mas a única coisa que conseguiu foi dar um soluço alto seguido de um jorro de água que nunca tinha derramado, nem mesmo nos momentos de egoísmo ou de manha... Ele chorou alto, eles congelaram, seus corações, como um só objeto, parou por um segundo, sentiram dentro deles a dor que Ele não entendia e não merecia sentir. Ela levantou-se, ele se vestiu, eles foram até Ele e ele não entendia, mas chorava, alma nua e desarmada, sem entender por quê. Eles o abraçaram e Ele soluçava, e soluçava, e não entendia o que diziam, apesar de garantirem estar tudo bem. "Como", pensava em meio àquela confusão que bagunçava sua cabecinha. Eles olharam-se, e pela primeira vez sentiram-se tão envergonhados quanto da primeira vez...

Todos choravam, mas agora a dor era a mesma, misturada à vegonha, ao arrependimento, ao não saber por quê...

Tato

Só sei que estou vivo, mais nada, porque sinto, desejo, quero, até posso, mas ao mesmo tempo não... não tenho!
O que fazer?
Desejo irresistível de ser irresistivelmente desejado...

Como ser?
Como?

Má notícia...

Recebo aquelas malditas linhas tortas, recheadas de palavras malditas, verdadeiras armas que ferem minha alma e consomem todas as minhas forças, toda minha pasciência, tudo... leio com pressa, como se a dor doesse menos se lesse mais rápido, mas que besteira, as palavras doem ao mesmo tempo, porque o tempo passa do mesmo jeito, resta condicionar minha pele para que não sinta, minha cabeça para que não pense, minha vida pra que não viva, apesar da vontade de viver... Estou confuso! Como dói.

Refaço-me do de tudo; o que me resta, se não sobreviver a tudo? Ser forte é a minha última esperança, pelo menos enquanto ainda quiser ser feliz, enquanto necessitar estar vivo, não importa como. Eu me refaço, aos poucos, daquilo; em meio a pessoas estranhas e rostos que me assustam, e releio, e vou digerindo aos poucos, e acordo do susto, e me refaço....

Derrepente sinto correr pelo meu rosto um líquido quente, certamente salgado, suor ou lágrimas, quem sabe, e sinto também o vento nos sílios, na pele ainda sensível do barbear mal feito e apressado. Minha pele dói pelo sol que queima sem pena, sinto o mundo mas não me comunico com ele, simplesmente vejo em meu pequeno espaço de visão minhas mãos trêmulas, o vento, os pedaços de papel... ao fundo ouço e até sinto as pessoas, que me tocam e me olham, mas eu permaneço só em meu infinito particular. Ah, o vento! É o vento que leva os pedacinhos de papel que vou guardando na palma de minha mão. O vento leva, como se com ele fossem os problemas, e as dores, e a ilusão, como se levasse você, maldito você...

Acordo!

Olho ao meu redor e agora vejo que as pessoas estão ali, e querem saber o que há ali, e se estou bem, e vejo as pessoas recolherem, inutilmente, os pedaços do papel que o vento sabiamente espalha; velo as pessoas mas não as quero em mim, e alguém diz que estou mal porque você se foi, "Há um adeus aqui", grita uma senhora gorda e morena, suada e cansada, mas tão solícita que me deu pena. Não fiz nada, não respondi a nada: recolhi minha alma, respirei, levantei o braço direito e dei sinal. O ônibus parou, limpei meu rosto, peguei meus óculos escuros com os quais me escondo do mundo, subi e parti. E olhei pra trás e vi as pessoas resmungarem algo que parecia raiva. Não ligo que tenham ira por mim, o que importa? Minha alma ferida agora só queria sair dali, só queria se recolher e esquecer a casca que deixei ali. Sim, eu troquei de pele, novamente, como sempre... Parti. Boa notícia. Pra onde, meu Deus!